DOE de 01/02/2002
ICMS – Dispõe sobre a inclusão do preço do serviço de “telemarketing” no preço das mercadorias (“valor da operação”) vendidas e na base de cálculo do ICMS de acordo com o artigo 24, § 1º, da Lei nº 6.374/89
O Coordenador da Administração Tributária, no uso das suas atribuições, e tendo em vistao disposto no artigo 522 do Regulamento do ICMS – RICMS, aprovado pelo Decreto n.º 45.490, de 30/11/00, decide:
1 – Fica aprovado o entendimento da Consultoria Tributária, cujo texto é reproduzido em anexo, que versa sobre a inclusão na base de cálculo do ICMS (“valor da a operação”) do preço do serviço de telemarketing, conforme exige o artigo 24, § 1º, da Lei nº 6.374/89.
2 – Conseqüentemente, com base no inciso II do artigo 521 do RICMS, ficam reformadas todas as respostas dadas pela Consultoria Tributária que, tratando do mesmo assunto, concluíram de modo diverso.
3 – Esta decisão entra em vigor na data de sua publicação.
“Entendimento CT:
1 – A Consulente é empresa sem inscrição no Cadastro de Contribuintes do ICMS que, segundo informa, “… encarrega-se de representar, divulgar e distribuir mercadorias de outra pessoa jurídica, ou seja, sua atividade consiste em divulgar e distribuir produtos comercializados por terceiros … através de meio de comunicação específico – televisão – operando o chamado ‘telemarketing’ … “.
2 – Esmiuça sua atividade descrevendo que “… incumbe-se dos serviços de propaganda, postagem, mala direta, entrega domiciliar das mercadorias e atendimento ao consumidor.” Ainda segundo o texto da Consulta, “… o comerciante dos produtos … não lhe paga qualquer remuneração pelos serviços; estes são pagos diretamente à Consulente pelos consumidores/destinatários, quando da entrega da mercadoria”.
3 – Participa que “tal procedimento decorre do fato de que a Consulente condiciona, para realização do seu trabalho, a concessão, por parte do comerciante, seu representado, para a venda do produto, assumindo, por sua conta e risco, todos os encargos com a divulgação, distribuição e atendimento dos consumidores”, que “nessas condições, paga pelos consumidores, encarrega-se também de todos os serviços relacionados com a entrega domiciliar, emitindo documento fiscal no valor desses serviços prestados, enquanto o comerciante/vendedor emite a Nota Fiscal que lhe competeà venda dos bens”, que “… a operação gera a emissão de duas Notas Fiscais, a saber: a primeira, emitida pelo representado, que é o fornecedor da mercadoria, para acompanhar a saída de seu estabelecimento até o destinatário; a segunda, emitida pela Consulente/prestadora do serviço ao destinatário, correspondente aos serviços de retirada do estabelecimento vendedor, para entrega domiciliar, a divulgação da mídia, o atendimento ao consumidor, etc.” e que “… entende … que seu procedimento se enquadra no item 100 da Lista de Serviços anexa ao Decreto-Lei n.º 406/68, em sua atual redação, ou seja, na de ‘Distribuição de Bens de Terceiros em Representação de Qualquer Natureza’ “.
4 – Por fim, pergunta se seu procedimento está correto.
5 – Para os fins dessa Resposta, estamos pressupondo que a Consulente não se apresenta ao mercado consumidor como comerciante. Quem se apresenta como comerciante, é juridicamente reputado como comerciante, pela figura do “comerciante aparente”, segundo a Teoria da Aparência. Ou seja, quando uma empresa, que não é comercial, produz a impressão que comercializa os produtos, é comerciante aparente, e deve-se submeter a todas as conseqüências jurídicas – comerciais, civis, tributárias, etc – de seus atos como se fosse comerciante. Estamos pressupondo também que a Consulente não realiza prestações de transporte intermunicipal ou interestadual, caso em que deve observar a legislação pertinente prevista no Regulamento do ICMS.
6 – O procedimento descrito nos itens 1 a 3 é incorreto e tem efeitos fiscais que precisam ser corrigidos, pelas razões que passaremos a expor. Inicialmente, serão resumidamente assentados alguns aspectos conceituais comerciais relevantes de telemarketing, de representação e de transporte e entrega de mercadorias.
7 – O telemarketing é um poderoso canal de vendas, que utiliza a televisão, o telefone ou outras formas de comunicação para atingir a clientela potencial, pelo qual se apresentam ao potencial consumidor todas as informações necessárias de um produto, entre as quais preço, quantidade, etc., para que ele possa decidir a respeito de uma compra e venda sem ser induzido em erro. O telemarketing é, portanto, uma espécie de marketing, que pode ser feito pela própria empresa ou terceirizado.
8 – Pelo instituto da representação comercial, uma empresa dá poderes a um terceiro para atuar em seu nome, realizando um negócio por sua conta ou defendendo seus interesses. Entre empresa e representante podem existir diversas formas contratuais: locação de serviços, mandato, comissão ou corretagem. É também possível que a representação comercial se dê sem relação contratual, mas por uma relação societária.
9 – O transporte de bens consiste em levá-los de um lugar a outro, pelos vários meios possíveis. Quando o comerciante, num contrato de compra e venda, assume a obrigação de efetuar o transporte, fazendo-o por conta própria ou contratando um transportador, a propriedade do bem vendido não se transmite até que ocorra a tradição efetiva, i.e., o ato de entrega da coisa (transferência da posse) ao comprador, que permanece no patrimônio do vendedor até esse momento. Se, ao contrário, é o comprador quem contrata o transporte, a transferência da propriedade ocorre no momento da entrega da coisa ao transportador, incumbido que foi pelo comprador de levar a coisa até ele.
10 – Pois bem, dessas três noções básicas acima seguem as conseqüências jurídicas para o caso em análise.
11 – Uma vez que, por meio de telemarketing, a Consulente oferece ao público mercadorias de terceiros, o consumidor não é e não pode ser parte nesse contrato de propaganda e marketing. Seria absurdo admitir o contrário, porque (1) esse contrato visa exatamente a atingir o consumidor, e (2) nenhum interesse lhe acolhe na divulgação de produtos de terceiros. Os interesses que motivam o contrato pertencem a empresa comercial e empresa de propaganda e marketing.
12 – Nas atividades diárias, a Consulente entra em contato com o cliente de seu representado com a obrigação de substitui-loem sua autonomia privada. Mas quando se celebra um contrato de compra e venda, suas partes serão a empresa representada e consumidor. A Consulente se interpõe apenas para defender os interesses daquele que está sendo substituído nessa relação. O consumidor não tem porque contactar a empresa de telemarketing, se não for para conhecer e adquirir as mercadorias que são vendidas pela empresa que lhes é a proprietária. O fato de tratar com a Consulente não significa que deseja contratar com ela, pois ela não tem nada a vender, mas a representar a vendedora, e o consumidor deseja apenas conhecer a mercadoria (pelo que não paga nada) ou comprá-la. A própria exclusividade da representação somente lhe interessa para saber que não poderá adquirir a mercadoria em outro lugar, e os demais termos da contrato de representação possivelmente não lhe dizem respeito jamais.
13 – Todo contrato pressupõe uma proposta e uma aceitação. A proposta feita ao consumidor que se interessa pelas mercadorias intermediadas pela Consulente incluem, com a venda, o transporte e a entrega. Se o consumidor não concordar com as condições de transporte e entrega, não pode, pela situação que o negócio se desenvolve, adquirir a mercadoria pretendida e contratar outra pessoa para fazer o transporte – não tem autonomia para desvincular a compra e venda do transporte, pois o contrato lhe é oferecido sem essa possibilidade – a venda intermediada pela Consulente inclui sempre a entrega.
14 – Enfim, todo negócio jurídico pode ser analisado de três distintas ópticas: forma, conteúdo e causa, devendo as três análises guardar consistência estrutural, racional e funcional. As causas dos contratos de telemarketing, da representação e do transporte são a viabilização da compra e venda, seus conteúdos são aqueles já expostos. Pretender que esses contratos estejam vinculando a Consulente – representante do vendedor – e comprador é dar-lhes forma irracional e desviar-lhes as funções, incompatibilizando-lhes as estruturas.
15 – O que se vê do que foi até aqui desenvolvido é que a Consulente realiza com sua representante um contrato misto, pois (conforme Orlando Gomes in “Contratos”, pág. 103, Ed. Forense, 1999, 18ª ed.) compõe-se de outros contratos e de prestações típicas de outros contratos, com unidade de causa – a realização de contratos adesivos (já que o consumidor pode apenas consentir na coisa e no preço) de compra e venda entre a representada e consumidores alcançáveis pelo sistema de telemarketing.
16 – O fato de o comerciante dos produtos não fazer diretamente os desembolsos para pagamento dos serviços prestados pela Consulente não significa que não seja ele quem a esteja pagando. A Consulente, recebe em nome de seu representado o pagamento feito pelos consumidores e retira desse montante seu pagamento porque assim está autorizada a fazer. Qualquer pagamento que fosse feito pelo consumidor à Consulente seria indevido, sem causa, pois o consumidor apenas se obrigou perante o vendedor, somente consentiu coisa e preço, embora por intermédio da Consulente.
17 – Portanto, como a Consulente presta serviços apenas à empresa vendedora, e não ao consumidor adquirente das mercadorias, como nenhuma relação jurídica existe entre Consulente e consumidor, o qual dirige sua vontade apenas para aceitar a coisa e o preço, não há que se falar em prestação de serviço para o consumidor. Nenhum contrato é sequer oferecido pela Consulente ao consumidor. A transmissão do poder de dispor dos bens que estão sendo entregues se dá de vendedor a comprador, e a posse dos mesmos pela Consulente se dá em nome do vendedor.
18 – A Consulente, ao adimplir seu contrato com a empresa representada e entregar ao consumidor a mercadoria adquirida, deve entregar Nota Fiscal, modelo 1 ou 1-A, emitida pela representada, cuja base de cálculo é o total dos valores cobrados. Como a Nota Fiscal em razão dos serviços prestados pela Consulente deve ser emitida para o tomador dos serviços, ela não deve ser fornecida ao consumidor.
19 – Uma mercadoria somente se transforma em bem de consumo depois de lhe serem integrados ao custo todos os fatores de produção e comercialização que, avaliados economicamente, unificados e somados ao lucro do último empresário que compõe todo o processo econômico, serão oferecidos, todos de uma só vez, pela oferta de uma única coisa e mediante o pagamento de um único preço, ao consumidor final.
20 – O ICMS recai sobre o total do valor pelo qual um bem de consumo é oferecido ao mercado. E, como a exação se dá nas atividades empresariais, cada etapa da cadeia econômica, tributada ou não pelo ICMS, que agrega valor a uma mercadoria, acaba por integrar a base de cálculo na operação ou prestação da etapa seguinte.
21. – Assim é que o serviço prestado pela Consulente, por ser despesa feita pelo vendedor, ao ser contabilmente absorvido pelo vendedor, acaba repercurtindo no ICMS que ele deverá pagar, nos termos da legislação tributária.
22 – Em conseqüência, segundo dispõe a Lei n.º 6.374/89 (art. 24, § 1º, itens 1 e 2), o valor total da mercadoria vendida,cobrado pelo vendedor ao adquirente, constitui o “valor da operação”, em sua inteireza, revelando a base de cálculo legal do tributo (ICMS) que deverá formar o valor a ser recolhido aos cofres do Estado, de acordo com as normas constantes do Regulamento do ICMS.
23 – Finalmente, com relação ao item da Lista de Serviços anexa ao Decreto-Lei n.º 406/68 que a Consulente executa, cabe ao Município dissipar tais dúvidas, relativas que são ao ISSQN.”