No início do mês de novembro, a Prefeitura de São Paulo publicou o Parecer Normativo 4/2016 para alterar os critérios por ela admitidos para fins da caracterização da isenção da exportação de serviços à tributação pelo Imposto sobre Serviços (ISS). A boa notícia é que esse parecer revogou o Parecer Normativo 2/2016, publicado em abril, segundo o qual, na prática, em São Paulo, jamais haveria isenção à exportação de serviço, o que, por sua vez, contrariava o art. 2º, I, da Lei Complementar (LC) 116/03. A notícia ruim é que os novos critérios fixados pela Prefeitura de São Paulo também merecem críticas, conforme examinado abaixo.
A Constituição Federal, em seu art. 156, §3º, II, delegou à lei complementar a atribuição de isentar a exportação de serviços à tributação pelo ISS. Assumindo tal atribuição, a LC 116/03 isentou, em seu art. 2º, a exportação de serviços, estabelecendo que os serviços cujos resultados se verifiquem no Brasil não estão isentos à tributação pelo ISS. Aplicando uma interpretação a contrário senso, conclui-se que estão isentos do ISS os serviços cujos resultados são caracterizados no exterior.
O problema central é que LC 116/03 não define o que é “resultado” para fins da isenção do ISS. Para compreensão desse conceito, deve-se recordar que a desoneração do ISS nas exportações tem como fundamento o princípio do destino, cuja adoção está consolidada nas relações internacionais no âmbito da OMC. De acordo com o princípio do destino, as importações são tributadas (no país importador) e as exportações são desoneradas de tributação (no país exportador), justamente para que não haja a exportação de tributos. No comércio internacional, a tributação recai sobre o consumo, e não sobre a atividade que origina o bem ou serviço consumido. Seguindo essa lógica, pode-se dizer que o “resultado” do serviço, para fins da desoneração das exportações, confunde-se com a utilidade que ele proporciona para o respectivo tomador.
Nesse contexto, a Prefeitura de São Paulo estabeleceu, em um primeiro momento (Parecer 2/16), que o “resultado” do serviço realizado por prestador paulistano no Município de São Paulo sempre se verificaria no Brasil, o que evidentemente era uma ficção que, na prática, impedia a caracterização da isenção de ISS à exportação de serviços. Ao modificar esse entendimento (por meio do Parecer 04/16), a Prefeitura voltou atrás e definiu que, em São Paulo, “considerar-se-á exportado quando a pessoa, o elemento material, imaterial ou o interesse econômico sobre o qual recaia a prestação estiver localizado no exterior”. Cabe reconhecer aqui um avanço. No entanto, sem nenhum motivo legítimo, o Parecer 04/16 determinou que, em relação a algumas situações (mesmo estando o prestador situado em São Paulo e o tomador, no exterior), não haveria exportação de serviços (para fins da isenção de ISS), o que novamente contraria a lógica do princípio do destino.
Tome-se como exemplo a exportação dos serviços de administração de fundos de investimentos, que, segundo a Prefeitura (art. 2º, IV, do Parecer 04/16), somente serão considerados exportados com relação à administração de ativos situados no exterior, independentemente do local onde está o respectivo tomador dos serviços. Para demonstrar o equívoco dessa interpretação, é necessário se identificar onde ocorre o “consumo” desse serviço: onde o serviço é usufruído (local em que o fundo de investimentos está localizado, beneficiando-se da utilidade do serviço prestado) ou onde o ativo (investimento) administrado está situado?
De acordo com o princípio do destino, a tributação dos serviços deve ocorrer no local em que se verifica a sua utilidade, o que, no caso do serviço de administração de investimentos financeiros, corresponde ao local onde está o tomador do serviço (no caso, o fundo de investimentos estrangeiro), pois os efeitos da utilidade do serviço são percebidos pelo tomador no local onde ele está situado, e não no local onde está o seu investimento. Em outras palavras, o “resultado” do serviço de administração de investimentos se dá no local onde está situado o contratante desse serviço. Note-se que esse entendimento chegou inclusive a ser adotado pelo Conselho Municipal de Tributos (Processo 2011-0.125.786-1) e pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (Processo 0022905-83.2013.8.26.0053).
Portanto, mesmo depois da edição do Parecer 04/16, a Prefeitura de São Paulo continua prejudicando a competitividade das empresas paulistanas que prestam serviço ao exterior, o que desestimula a atração de investimentos para a capital paulista e, por isso, esse entendimento merece ser revisto o quanto antes.
Fonte: Revista Eletrônica CONJUR