A Receita Federal decidiu suspender as notificações que vinha fazendo desde o dia 4 de setembro a magistrados e membros do Ministério Público nas quais apontava a incidência de imposto de renda sobre o auxílio-moradia. O recuo veio após um despacho da Advocacia-Geral da União (AGU), desta quarta-feira, 19, informar que o benefício, por ser indenizatório, não deve ser tributado.

A mudança de posicionamento foi comunicada em reunião nesta tarde entre o secretário da Receita Federal, Jorge Rachid, e representantes da Frente Associativa da Magistratura e do Ministério Público (Frentas). O órgão encaminhou um comunicado interno destacando a suspensão das notificações. No início da noite, a Receita confirmou a informação.

O entendimento da Receita era o de que as liminares concedidas pelo ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal (STF), garantindo o benefício de R$ 4,3 mil a magistrados e procuradores de todo o Brasil, não deixavam claro que esses valores não deveriam integrar a base de cálculo do imposto de renda.

“A Receita Federal elaborou comunicação aos contribuintes com o objetivo de orientar que todo o valor que excedesse ao efetivamente comprovado com o pagamento de aluguéis e moradia deveria ser acrescido aos demais rendimentos tributáveis para fins de incidência do imposto de renda”, disse a Receita. Ao mesmo tempo, todas as Declarações de Imposto de Renda das Pessoas Físicas foram reprocessadas para aguardar as retificações.

A Advocacia-Geral da União, então, encaminhou um parecer ao Ministério da Fazenda dizendo que a verba tinha caráter indenizatório e por isso não deveria ser tributada. A Receita Federal pediu esclarecimento adicional sobre essa informação, e a AGU reforçou esse ponto, em novo despacho assinado pela Consultoria-Geral da União e encaminhado nesta quarta-feira, 19, pela ministra Grace Mendonça. A Receita, então, decidiu voltar atrás.

O auxílio-moradia custa, em média, R$ 139 milhões por mês aos cofres públicos, segundo a consultoria da Câmara dos Deputados. Se fossem cobrados os 27,5% do imposto de renda sobre o benefício, isso significaria o retorno de R$ 38,2 milhões por mês aos cofres públicos, ou R$ 458,7 milhões por ano.

Pressão

Desde o início do mês, havia uma forte reação das associações representativas da classe contra as notificações da Receita. Em reuniões e comunicados internos, as associações deixavam claro que estavam atuando para impedir a cobrança de imposto de renda sobre o auxílio-moradia.

O comunicado desta quarta-feira que informou a resolução da situação de forma favorável aos magistrados e procuradores teve a assinatura do coordenador da Frente Associativa da Magistratura e do Ministério Público (Frentas) e presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), Guilherme Guimarães Feliciano, e de mais oito presidentes de associações que integram a frente.

“Na tarde desta quinta (20/9), estivemos com o secretário da Receita Federal, Jorge Rachid. Na ocasião, foi-nos informado que, ante o novo parecer da Advocacia-Geral da União (AGU), recebido na noite de ontem, em que, além do caráter indenizatório da ajuda de custo para moradia, esclareceu-se a não incidência de Imposto de Renda de Pessoa Física (IRPF) sobre a parcela, a Receita Federal vai tornar sem efeito as notificações encaminhadas a juízes e membros do Ministério Público com relação à retificação das declarações do devido ao recebimento da parcela”, diz o comunicado da Frentas.

O comunicado diz, também, que “o status das declarações de ajuste retornará à condição originária, o que se dará em, no máximo, duas semanas, de modo a liberar todos os processamentos, inclusive para fins de restituição”.

Estadão Conteúdo

NOTA EXECUTIVA DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL

Nota executiva

Incidência de imposto de renda sobre auxílio-moradia

Os valores recebidos a título de auxílio-moradia por membros do Poder Judiciário, do Ministério Público e por Conselheiros e Ministros dos Tribunais de Contas, em decorrência de medida liminar de 15 de setembro de 2014 no âmbito da Ação Ordinária nº 1.773 – STF, foram, naquela oportunidade, considerados como de caráter indenizatório.

Não havia, contudo, disposição expressa na lei ou na decisão do Ministro Relator no sentido de que os referidos valores não integrariam a base de cálculo do imposto de renda, como determina o art. 176 do Código Tributário Nacional.

Dessa forma, em 4 de setembro de 2018, a Receita Federal elaborou comunicação aos contribuintes com o objetivo de orientar que todo o valor que excedesse ao efetivamente comprovado com o pagamento de aluguéis e moradia deveria ser acrescido aos demais rendimentos tributáveis para fins de incidência do imposto de renda. Na mesma oportunidade, todas as Declarações de Imposto de Renda das Pessoas Físicas foram reprocessadas para aguardar as retificações.

Em 5 de setembro de 2018, a Receita Federal tomou conhecimento, via Ofício nº 084 CGU/AGU, do Parecer nº GMF-08, que ao analisar a decisão proferida na Ação Ordinária nº 1.773 – STF, reforçava o caráter indenizatório do auxílio-moradia pago em razão da liminar concedida. Referido Parecer foi aprovado pelo Exmo. Senhor Presidente da República, sendo, portanto, de caráter vinculante para todos os órgãos do Poder Executivo.

Como não restou claro no referido parecer se a verba recebida era isenta para fins tributários, a Receita Federal solicitou esclarecimento adicional à Advocacia-Geral da União.

Em 19 de setembro de 2018, em resposta ao Ofício nº 892/2018-RFB/Gabinete, em Despacho do Consultor-Geral da União nº 00752/2018/GAB/CGU/AGU, aprovado pela Exma. Senhora Advogada-Geral da União, foi esclarecido o seguinte, in verbis:

(…) 9. Assim sendo, ao se externar o caráter indenizatório da ajuda de custo para moradia, tanto na fundamentação quanto, em especial, na parte dispositiva da decisão judicial em foco, atrai-se a incidência do respectivo regime jurídico, inclusive, em relação aos efeitos tributários. (grifos no original) (…)

Dessa forma, em obediência a esse entendimento vinculante, a Receita Federal informa que ficam canceladas as orientações expedidas para retificação das Declarações de Imposto de Renda das Pessoas Físicas beneficiárias do auxílio-moradia em decorrência da Ação Ordinária nº 1.773 – STF, bem assim que as respectivas declarações serão retornadas ao status quo anterior.

Fonte: RFB