O CONSELHO ESTADUAL DO MEIO AMBIENTE – CONSEMA no uso de suas atribuições, que lhe conferem a Lei n° 10.330, de 27 de dezembro de 1994.
CONSIDERANDO a necessidade de estabelecer diretrizes e critérios gerais que regulamentem e estimulem a prática de aplicação de água de reúso no Estado do Rio Grande do Sul;
CONSIDERANDO que o art. 27 da Resolução Conama n° 430/2011 indica que as fontes potencial ou efetivamente poluidoras dos recursos hídricos deverão buscar práticas de gestão de efluentes com vistas ao uso eficiente da água devendo, sempre que técnica e economicamente viável, proceder à reutilização;
CONSIDERANDO a Resolução CNRH n° 121/2010 que estabelece diretrizes e critérios para a prática de reúso direto não potável de água na modalidade agrícola e florestal, definida na Resolução CNRH n° 54, de 28 de novembro de 2005;
CONSIDERANDO que a prática de reúso de água reduz a descarga de poluentes em corpos receptores, conservando os recursos hídricos para o abastecimento público e outros usos mais exigentes quanto à qualidade;
CONSIDERANDO que a água de reúso pode ser um fator produtivo importante nos tratos culturais das plantas cultivadas e que seu uso deve preservar as características produtivas;
CONSIDERANDO que a prática de água de reúso deve garantir a minimização de riscos químicos e biológicos ao meio ambiente e não comprometer as atividades envolvidas na sua finalidade de uso;
RESOLVE:
Art. 1° Esta Resolução estabelece critérios e procedimentos para a utilização não potável de água de reuso proveniente de efluentes líquidos tratados de origem industrial ou sanitário, para fins urbanos, industriais, agrícolas e florestais, no Estado do Rio Grande do Sul.
CAPÍTULO I
DAS DEFINIÇÕES
Art. 2° Para efeito desta Resolução são adotadas as seguintes definições:
I – Acesso irrestrito: áreas públicas ou privadas em que circulem indivíduos que possam vir a ter contato direto com a água de reúso, tais quais parques, praças, jardins, cemitérios, áreas verdes de condomínios, campos de esporte, entre outros;
II – Acesso limitado ou restrito: áreas públicas ou privadas cujo contato com a população seja insignificante, tais quais taludes e canteiros de rodovias, construção civil, áreas da estação de tratamento de efluentes cujo acesso seja limitado aos trabalhadores, entre outros;
III – Água de reúso: efluente tratado em grau suficiente para atender os padrões de qualidade definidos nesta resolução para aproveitamento não potável em determinadas atividades que não requerem necessariamente o uso de água potável;
IV – Carbonato de Sódio Residual – CSR: índice que avalia a qualidade da água de irrigação, no que diz respeito a influência da presença de íons carbonato e bicarbonato no cálculo da Razão de Adsorção de Sódio (RAS);
V – Classe de qualidade: conjunto de condições e padrões de qualidade para uma água de reúso necessários ao seu uso pretendido;
VI – Condutividade Elétrica: capacidade dos materiais, que podem ser classificados em condutores, semicondutores e isolantes, de conduzirem uma corrente elétrica, a qual é facilitada na água pelos seus compostos iônicos dissolvidos, sendo indicadora do teor de sais contidos na solução aquosa.
VII – Distribuidor de água de reúso: pessoa jurídica, de direito público ou privado, que distribui água de reúso para utilização própria ou de terceiros;
VIII – Efluente líquido industrial: despejo líquido resultante de qualquer atividade produtiva, oriunda prioritariamente de áreas de transformação de matérias primas em produtos acabados;
IX – Efluente líquido sanitário: despejo líquido resultante do uso da água para higiene e necessidades fisiológicas humanas;
X – Irrigação paisagística: prática de irrigação de parques, jardins, campos de esporte e de lazer urbanos ou áreas verdes em condomínios, cemitérios ou taludes de rodovias. Não inclui a irrigação para uso agrícola e florestal;
XI – Padrão de qualidade: valor máximo permitido, atribuído a cada parâmetro passível de controle;
XII – Percentual de Sódio Trocável – PST: Índice que indica o grau de saturação do complexo de troca do solo com o íon Sódio;
XIII – Razão de Adsorção de Sódio (RAS): razão entre os íons de sais solúveis que indica a concentração de sódio contida no efluente, em relação ao cálcio e magnésio, que pode ser adsorvido pelo solo, sendo um critério adotado para avaliar o risco de solidificação do solo em função da concentração de sódio contida no efluente;
XIV – Razão de Adsorção de Sódio Ajustada (RAS ajust.): analise que inclui a influência dos íons carbonato e bicarbonato;
XV – Registros operacionais: documento que contem informações técnicas sobre volume aplicado no período, área de efetiva aplicação, distribuição, método, taxa de aplicação do efluente nas áreas, medidas de controle para minimizar o risco de contaminação em eventuais inconformidades e monitoramento;
XVI – Reúso para fins agrícolas e florestais: aplicação de água de reúso para produção agrícola, cultivo de florestas plantadas e recuperação de áreas degradadas;
XVII – Reúso para fins industriais: utilização não potável de água de reúso em processos, atividades e operações industriais;
XVIII – Reúso para fins urbanos: utilização de água de reúso em áreas urbanas, industriais ou rurais, públicas ou privadas, para fins de irrigação paisagística, lavagem de logradouros e veículos, desobstrução de tubulações, obras civis, equipamentos, instalações, entre outros usos não potáveis;
XIX – Usuário de água de reúso: pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, que utiliza água de reúso proveniente de efluentes líquidos tratados de origem industrial ou sanitário para os fins previstos nesta resolução;
CAPÍTULO II
DAS CONDIÇÕES E PADRÕES PARA ÁGUA DE REÚSO
Seção I
DAS DISPOSIÇÕES GERAIS
Art. 3° Na geração de água de reúso deverão ser atendidas as seguintes condições:
I – padrões de qualidade estabelecidos nos Artigos 11 e 12 desta Resolução, de acordo com a aplicação de água de reúso.
II – monitoramento periódico dos parâmetros, conforme finalidade da água de reúso, na frequência descrita no quadro a seguir:
Vazão da água de reúso (m3 /dia) | Frequência |
Q ≤ 150 | Semestral |
150 < Q ≤ 300 | Trimestral |
300 < Q | Bimensal |
III – controle e registro do volume gerado, destinação e eventuais inconformidades ocorridas e ações corretivas adotadas e demais registros operacionais.
Parágrafo único. O órgão ambiental competente poderá exigir monitoramento com frequência diferenciada da estabelecida no inciso II, desde que tecnicamente justificado.
Art. 4° Na distribuição e na aplicação de água de reuso deverá ser utilizado sistema devidamente sinalizado como “não potável”, sendo vedada a mistura de água de reúso de diferentes geradores, com a finalidade de evitar a contaminação cruzada e garantir sua rastreabilidade;
Art. 5° Na aplicação de água de reúso deverão ser atendidas as seguintes condições:
I – manutenção dos padrões de qualidade estabelecidos nos Artigos 11 e 12 desta Resolução, de acordo com a aplicação de água de reúso.
II – licenciamento ambiental junto ao órgão ambiental competente, conforme as atividades definidas em Resolução do Conselho Estadual de Meio Ambiente.
III – disponibilidade de registros operacionais.
Art. 6° O licenciamento da aplicação da água de reuso para fins agrícolas e florestais será realizado junto ao órgão ambiental competente e poderá ter como empreendedor o gerador ou o usuário da água de reuso.
Parágrafo único. Poderão ser licenciadas várias áreas e formas de uso no mesmo processo administrativo quando o licenciamento ambiental da aplicação for requerido pelo gerador.
Art. 7° É vedado a aplicação de agua de reuso em raio mínimo de 70 (setenta) metros de poços e outras captações de água subterrâneas utilizadas para abastecimento de água para consumo humano.
Art. 8° É vedada a aplicação de água de reúso para fins urbanos, agrícolas e florestais oriunda de processos industriais que apresentem substâncias definidas como poluentes orgânicos persistentes.
Art. 9° Somente será admitida a aplicação de água de reúso em Áreas de Preservação Permanente em casos de projetos de recuperação de áreas degradadas previamente aprovados pelo órgão ambiental competente.
Seção II
DAS CONDIÇÕES E PADRÕES DA ÁGUA DE REÚSO PARA FINS URBANOS
Art. 10. A água de reúso para fins urbanos é dividida em duas classes de qualidade:
I – Classe A: água de reúso destinada à irrigação paisagística em locais de acesso irrestrito, lavagem de logradouros públicos e lavagem de veículos;
II – Classe B: água de reúso destinada à irrigação paisagística em locais de acesso limitado ou restrito, ao abatimentode poeira, aos usos na construção civil e em estações de tratamento de efluente e à desobstrução de redes de esgoto pluvial e/ou cloacal.
Art. 11. A água de reúso para fins urbanos deverá atender os padrões de qualidade definidos:
Parâmetros | Classe A | Classe B |
Coliformes Termotolerantes | < 200 NMP/100 mL | < 10³ NMP/100 mL |
Ovos de helmintos | < 1 ovo/L | Não se aplica |
Cloro Residual Total | < 1 mg/L | |
Condutividade elétrica | <3 dS/m |
§ 1° Os valores constantes na tabela acima poderão ser alterados mediante justificativa técnica a expensas do solicitante;
§ 2° Aplicam-se os parâmetros Cloro Residual Total, Condutividade Elétrica quando a água de reúso é destinada à irrigação paisagística.
§ 3° A água de reuso destinada à irrigação paisagística deverá atender aos critérios estabelecidos no Art. 15 desta Resolução.
§ 4° Quando a água de reúso for destinada à desobstrução de redes de esgoto pluvial ou cloacal é dispensado o atendimento do parâmetro coliformes termotolerantes.
Seção III
DAS CONDIÇÕES E PADRÕES PARA REÚSO DE ÁGUA NO MEIO AGRÍCOLA E FLORESTAL
Art. 12. A água de reúso utilizada para fins agrícolas e florestais deverá atender os valores máximos para os seguintes parâmetros:
PARÂMETROS | PADRÃO DE QUALIDADE |
pH | Entre 6 e 9 |
Alumínio | 5 mg/L |
Arsênio | 0,1 mg/L |
Bário | 5 mg/L |
Boro | 0,5 mg/L |
Cádmio | 0,01 mg/L |
Chumbo | 0,5 mg/L |
Cianeto | 0,2 mg/L |
Cloreto | 106,5 mg/L |
Cobalto | 0,05 mg/L |
Cobre | 0,2 mg/L |
Cromo total | 0,5 mg/L |
Cromo hexavalente | 0,1 mg/L |
Ferro | 5 mg/L |
Fluoreto | 10 mg/L |
Manganês | 0,2 mg/L |
Mercúrio | 0,01 mg/L |
Molibdênio | 0,5 mg/L |
Níquel | 0,2 mg/L |
Selênio | 0,02 mg/L |
Sulfeto | 1 mg/L |
Vanádio | 0,1 mg/L |
Zinco | 2 mg/L |
Óleos e Graxas: mineral | 10 mg/L |
Óleos e graxas: vegetal ou animal | 30 mg/L |
Fenóis totais (substâncias que reagem com 4-aminoantipirina) | 0,1 mg/L |
Coliformes Termotolerantes | 104 NMP/100 mL |
Ovos de helmintos | 1 Ovo/L |
§ 1° Os parâmetros constantes na tabela acima serão aplicados conforme a origem da água de reúso.
§ 2° Para os parâmetros Nitrogênio total, Fósforo total e Potássio a concentração encontrada na água de reuso será utilizada para cálculo da taxa de aplicação. A carga aplicada de cada elemento não deverá exceder as recomendações de adubação para a cultura adotada, expressa em kg/ha, conforme tabelas constantes no “Manual de Calagem e Adubação para os Estados do Rio Grande do Sul e Santa Catarina”, elaborado pela Sociedade Brasileira de Ciência do Solo-Núcleo Regional Sul.
§ 3° O órgão ambiental competente poderá adotar parâmetros complementares à tabela apresentada acima, desde que tecnicamente justificado.
Art. 13 No primeiro licenciamento para utilização de água de reúso para fins agrícolas e florestais deverá ser apresentada uma análise de solo da área objeto da aplicação.
I – A análise de solo deverá contemplar o cálculo do Percentual de Sódio Trocável (PST) do solo e os seguintes parâmetros: condutividade elétrica, argila, pH, índice SMP, fósforo, potássio, matéria orgânica, alumínio, cálcio, magnésio, H + Al, CTC, saturação de bases e saturação de alumínio e enxofre, cobre zinco, manganês, sódio, boro, cádmio, níquel, chumbo, mercúrio, arsênio, molibdênio, selênio, vanádio, cobalto, bário, cromo hexavalente e cromo trivalente.
II – No monitoramento do solo, a amostragem do solo, bem como a determinação do número de sub-amostras coletadas para a composição da amostra composta, deverão atender à metodologia descrita no “Manual de Calagem e Adubação para os Estados do Rio Grande do Sul e Santa Catarina”, elaborado pela Sociedade Brasileira de Ciência do Solo- Núcleo Regional Sul.
III – Deverá ser indicado ao órgão ambiental qual rodízio cultural que será adotado quando da adoção do reúso.
IV – Havendo alterações nas culturas adotadas tal informação deverá ser notificada ao órgão ambiental.
Art. 14. O monitoramento da área de aplicação será realizado através de análise de solo com periodicidade anual para os parâmetros definidos pelo órgão ambiental competente no processo de licenciamento conforme características da água de reúso.
Parágrafo único. O órgão ambiental competente poderá solicitar a frequência diferente de acordo com a análise do projeto apresentado, desde que tecnicamente justificado.
Art. 15. A razão de adsorção de sódio (RAS) não pode passar do nível 12 na água de reúso, em função do risco de sodicidade do solo e deverá manter correlação com a condutividade elétrica da água de reúso para minimizar problemas de permeabilidade dos solos, conforme o quadro a seguir:
RAS | CONDUTIVIDADE ELÉTRICA (dS/m) | |
Mínima | Máxima | |
0-3 | 0,2 | 2,9 |
3-6 | 1,2 | 2,9 |
6-12 | 1,9 | 2,9 |
Parágrafo único. Poderão ser utilizados outros índices para avaliação da qualidade da água de reúso com a finalidade de estimar o risco de toxicidade do íon sódio nas culturas e possíveis impactos negativos na estrutura do solo como, por exemplo, cálculo de Carbonato de Sódio Residual (CSR) e da Razão de Adsorção de Sódio Ajustada (RAS ajust);
Art. 16. A utilização de água de reúso será vetada na produção de frutos, hortaliças, raízes e tubérculos onde o produto fique em contato direto com o solo ou com a água de reúso para consumo humano na forma crua.
Seção IV
DAS CONDIÇÕES E PADRÕES DA ÁGUA DE REÚSO PARA FINS INDUSTRIAIS
Art. 17. A qualidade e quantidade da água de reúso para fins industriais deverão obedecer às especificações técnicas de acordo com a finalidade e tecnologia do processo industrial a que se destina.
CAPÍTULO III
DAS DISPOSIÇÕES FINAIS
Art. 18. O descumprimento ao disposto nesta Resolução ou a adoção de qualquer procedimento envolvendo a água de reúso que resultem em riscos à saúde pública ou ao meio ambiente sujeitam os responsáveis às penalidades previstas na legislação ambiental.
Art. 19. A Escherichia coli poderá ser determinada em substituição ao parâmetro Coliformes termotolerantes e a proporção de correlação entre eles definida junto ao órgão ambiental competente.
Art. 20. Os critérios técnicos adotados nesta Resolução poderão ser reformulados e complementados a qualquer tempo CONSIDERANDO o desenvolvimento científico e tecnológico, os dados gerados nas operações dos sistemas e a necessidade de preservação ambiental, proteção da saúde pública e manejo sustentável da água.
Art. 21. Demais finalidades de reúso que não constem nesta Resolução serão objeto de análise específica.
Art. 22. Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação.
Porto Alegre, 13 de fevereiro de 2020.
PAULO ROBERTO DIAS PEREIRA
Presidente do CONSEMA
Secretário Adjunto do Meio Ambiente e Infraestrutura