O fim do julgamento que definiu a exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e da Cofins abre para a Receita Federal a possibilidade de realizar novas cobranças de tributos. Isso porque incide a alíquota de 34% de IRPJ e CSLL sobre valores devolvidos aos contribuintes. A situação tem levado ao Judiciário empresas que tentam adiar o pagamento desta tributação para o momento em que, efetivamente, os créditos entrarem no caixa.
A jurisprudência está longe de ser pacífica. Mas há decisões favoráveis a empresas que podem servir de argumento em processos semelhantes.
A Receita exige o IRPJ e a CSLL na hora do trânsito em julgado, quando não cabe mais recurso da decisão judicial. Contribuintes pedem na Justiça para serem tributados apenas quando o pedido de compensação dos créditos de PIS e Cofins, sem o ICMS, for homologado pela Receita. Como o intervalo entre um e o outro momento para ficar quites com o Fisco pode chegar a dez anos, uma decisão judicial pode ter impacto significativo.
As compensações tributárias feitas pelos contribuintes atingiram R$ 67,592 bilhões de janeiro a abril de 2021, impulsionadas pela utilização dos créditos envolvendo a “tese do século”. Isso indica um avanço real de 40,37% sobre o mesmo período de 2020. De 2017 até agora, foram utilizados R$ 117,5 bilhões em créditos associados à tese.
Após o trânsito em julgado da decisão que concedeu o direito aos créditos, a empresa tem cinco anos para habilitar o crédito na Receita. Uma vez autorizada a habilitação do crédito, são apresentadas as declarações de compensação (DComps), explica o advogado Caio Malpighi, do escritório Mannrich e Vasconcelos Advogados. A Receita tem mais cinco anos para homologar ou não os créditos. A Selic incide até o momento da compensação.
“Ainda não há uma consolidação da jurisprudência sobre o momento da tributação”, afirma Malpighi. Há decisões pelo momento do trânsito em julgado, o da homologação e a intermediária, na transmissão da DComp. “Isso ainda vai ser objeto de muito contencioso, especialmente com os trânsitos em julgado, agora, sobre a tese de retirada do ICMS da base do PIS e da Cofins.”
A Receita define o momento da tributação por meio de normas administrativas. Pelo Ato Declaratório Interpretativo (ADI) nº 25, de 2003, afirma que nos casos de repetição de indébito – quando deve ser devolvido um valor pago a mais-, a receita é tributável no trânsito em julgado da sentença judicial que define o valor a ser restituído. Pela Solução de Consulta nº 233, de 2007, a Receita confirma que créditos reconhecidos passam a ser tributáveis na data do trânsito em julgado.
Uma empresa de tecnologia do interior de São Paulo, representada pela advogada Camila Camargo Altero, sócia do escritório Benício Advogados, obteve decisão favorável na 2ª Vara Federal de Jundiaí (5005150-97.2020.4.03.6128). “Enquanto não houver a homologação da compensação, os indébitos tributários decorrentes de sentenças transitadas em julgado não podem sofrer a incidência do IRPJ e da CSLL”, afirma o juiz federal José Eduardo de Almeida Leonel Ferreira na decisão.
Segundo Daniel Ávila Thiers Vieira, do escritório Locatelli Advogados, não há, logo após o trânsito em julgado, a ocorrência de fato que permita a tributação. “O entendimento da Receita é muito desfavorável”, afirma.
Mas, em julgado recente, a 3ª Turma do Tribunal Regional Federal (TRF) da 5ª Região, localizado no Recife, decidiu que, se a decisão do trânsito em julgado já indicar o valor a compensar, a partir dela ocorre a tributação. Contudo, caso não seja definido o montante a ser devolvido ao contribuinte, a tributação só incide no momento da declaração de compensação. Unânime, a decisão manteve o mandado de segurança concedido à Jav Indústria de Alimentos. Os embargos de declaração da União foram negados (processo nº 0800221-81.2020.4.05.8500).
Na 3ª Região, que engloba os Estados de São Paulo e Mato Grosso do Sul, há decisões favoráveis e contrárias às empresas. Recentemente, a 4ª Turma do TRF manteve liminar em mandado de segurança para a tributação só ocorrer no momento da homologação da compensação. No voto, a relatora, desembargadora federal Marli Ferreira, afirma que até a decisão administrativa que homologa a habilitação creditória do contribuinte, os valores reconhecidos pela decisão judicial não são certos, líquidos e exigíveis. A decisão foi unânime (processo nº 5010177-15.2020.4.03.0000).
Por outro lado, a juíza Ana Lucia Petri Betto, da 6ª Vara Cível Federal de São Paulo negou o pedido de um contribuinte. “A partir do trânsito em julgado da sentença, nasce a disponibilidade jurídica da renda, estando, assim, configurado o fato gerador do imposto de renda” (processo nº 5024168-91.2020.4.03.6100).
A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) não retornou até o fechamento da reportagem.
Fonte: Valor Econômico / Associação Paulista de Estudos Tributários