A Receita Federal tem focado na fiscalização dos chamados “planejamentos tributários abusivos” ou, como classifica “milagres tributários”. Na prática, mudou a forma de fiscalizar e passou a analisar a situação como um todo. A atuação, entretanto, pode ser passível de questionamento, administrativamente e judicialmente.
Segundo notas divulgadas nesta semana, a RFB tem identificado casos em que prejuízos artificiais de empresas controladas por empresas brasileiras, domiciliadas no exterior, utilizam amortizações de ágios indevidamente, resultando em compensação de lucro que deveria ser tributado no Brasil por meio da tributação de lucros no exterior.
Segundo a Receita, a legislação tributária em vigor não permite a amortização desse ágio. “Constata-se uma tentativa por parte de algumas empresas de burlar a legislação interna ao intentarem transferir esse ágio para as controladas que estão no exterior, visando anular o lucro dessas empresas”, diz trecho de uma das notas da Receita.
O órgão afirma ainda que tem constatado a existência de planejamento tributário abusivo também em operações de triangulação nas exportações. Nesta modalidade, contribuintes integram grupos multinacionais que negociam a maior parte de suas exportações por intermédio de empresas controladas no exterior.
“A ilegalidade está no preço praticado nas operações de exportações (Preços de Transferência), no tratamento dado ao lucro auferido no exterior (TBU) e nas características da empresa controlada no exterior, as quais não apresentavam propósito negocial e substrato econômico que justificassem o modelo adotado de triangulação nas exportações”, defende a Receita.
Atuação Questionável
De acordo com o especialista em Direito Tributário Dalton Miranda, é questionável a Receita tratar tais temas como planejamento tributário abusivo.
“Quanto ao ágio, por exemplo, é preciso recordar que o ágio veio a reboque da legislação da privatização, à época do governo FHC, como atrativo aos investidores. Tempos depois, e tendo como marco temporal a operação Zelotes, passou-se a limitar a legitimidade das operações com ágio. Aliás, veio legislação posterior vedando o aproveitamento do ágio”, diz.
Segundo Miranda, para as operações anteriores à novel legislação o Poder Judiciário tem, inclusive, reformado decisões do Carf sobre a matéria. “Mesmo aquelas para operações com utilização de empresa veículo”, explica.
Dalton explica ainda que, para a hipótese de triangulação de exportações, o Carf, recentemente, julgou processo de companhia exportadora de grãos afastando a autuação levada a efeito e sobre tal tema. Na ocasião, o colegiado anulou uma autuação de R$ 10 bilhões da exportadora de grãos Cargill. A brasileira exportava para uma filial que ficava numa ilha tropical caribenha. Lá, os grãos eram revendidos para outra empresa.
“Por certo a Procuradoria da Fazenda recorrerá à Câmara Superior, mas isso já demonstra a fragilidade da afirmativa de que tais operações seriam planejamentos tributários abusivos”, explica.
Para a Receita, a arquitetura do planejamento tributário abusivo envolve operações encadeadas que, se analisadas isoladamente, podem apresentar aparente licitude, porém, na análise em conjunto, não é raro que transpareçam outra realidade, muitas vezes totalmente desprovida de causas negociais.
Entendimento Firmado
Em março, a 1ª Turma Ordinária da 3ª Câmara da 3ª Seção do Carf entendeu que o contribuinte estará no campo da ilicitude se o negócio jurídico for simulado ou se as condutas esconderem, modificarem ou excluírem o fato jurídico tributário. Nesses casos, o planejamento tributário apresentado ao Fisco é inválido.
Fonte: Consultor Jurídico