Grandes empresas começam a contabilizar os ganhos com a exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e da Cofins, definida pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em 2017. Pão de Açúcar, Telefônica Brasil, Via Varejo e Hering têm, juntas, pelo menos R$ 2,8 bilhões em créditos, de acordo com os balanços do segundo trimestre.
Apesar de estar pendente um recurso da Fazenda Nacional (embargos de declaração), que pode limitar o alcance da decisão do STF, os tribunais regionais federais (TRFs) e o Superior Tribunal de Justiça (STJ) estão finalizando os processos, o que tem beneficiado empresas. De acordo com advogados, os valores já podem ser aproveitados, principalmente por contribuintes com ações que transitaram em julgado.
O caso da Telefônica Brasil está entre os finalizados no STJ, o que impede a Fazenda Nacional de recorrer. O tribunal negou recurso para levar o tema ao Supremo com base em precedente que autoriza o julgamento de causas idênticas pelas instâncias inferiores após repercussão geral, mesmo sem a decretação do trânsito em julgado.
Nas demonstrações financeiras do segundo trimestre, a Telefônica afirma que seu lucro líquido contábil de R$ 3,16 bilhões foi influenciado por um efeito não recorrente – recebimento de R$ 1,8 bilhão pelo direito da exclusão do ICMS da base de cálculo das contribuições ao PIS e Cofins que estava em julgamento no Superior Tribunal de Justiça.
Em estágio mais avançado, o Pão de Açúcar informa, em seu balanço do período, que vendeu a terceiros parte dos créditos fiscais. De acordo com o grupo, o ganho decorrente dessa alienação somou aproximadamente R$ 50 milhões (R$ 45 milhões sem imposto).
Como o STF ainda não finalizou o julgamento, alguma alteração na decisão ainda poderá refletir em balanço futuro, segundo o Pão de Açúcar. O grupo informa ainda que não está prevista nova venda de créditos, mas “avalia oportunidades constantemente”. Essa, acrescenta, é a tese judicial mais relevante para a companhia.
A Via Varejo decidiu esperar pela decisão nos embargos de declaração no STF, segundo informa em suas demonstrações financeiras do segundo trimestre. Mas acredita que a decisão não irá limitar seu direito. A companhia estima que tem R$ 944 milhões a receber, referentes a créditos de 2010 a fevereiro de 2017. O valor inclui atualização monetária e honorários a 07/08/2018. Balanços apontam ganhos de R$ 2,8 bi com exclusão do ICMS do PIS/Cofins 2/3 serem pagos a advogados.
O crédito foi divulgado, mas não registrado. Na Justiça, a Via Varejo pediu o direito de deduzir o ICMS e o ICMS-ST (substituição tributária) da base de cálculo do PIS e da Cofins. Os cálculos começaram a ser feitos depois da publicação do acórdão do STF.
No caso da Hering, a retração no lucro bruto por causa do volume de vendas e redução na margem bruta foi parcialmente compensada pelo reconhecimento de R$ 4,2 milhões referentes à exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e da Cofins.
A Ambev também cita a questão em seu balanço, mas sem valores. Apenas afirma que o aumento de receitas, no período, foi beneficiado pelo julgamento do Supremo. E acrescenta que esse benefício foi “quase totalmente” compensado pelo aumento da alíquota de PIS e Cofins implementada em janeiro.
Em nota, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) informa que o julgamento do STF gerou cenário de “forte insegurança jurídica”, especialmente pela pendência de julgamento dos embargos de declaração e pela não suspensão nacional dos processos. De acordo com o órgão, há processos sendo finalizados por esgotamento das vias recursais, o que pode resultar na banalização da ação rescisória – proposta para tentar mudar decisão transitada em julgado.
A rescisória poderá ser utilizada em caso de modulação de efeitos ou de modificação do acórdão. Segundo a procuradoria, ainda não são conhecidos os fundamentos determinantes adotados pela maioria vencedora no STF.
“Não houve uniformidade de fundamentos entre os votos dos ministros que integraram a maioria”, afirma a PGFN na nota.
O órgão acrescenta, na nota, que também não foi indicada a forma de cálculo para operacionalizar a exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e da Cofins. Por isso, tem recorrido em todas as tentativas de aplicação da tese.
Para o advogado Luciano Ogawa, do escritório Martins Ogawa, Lazzerotti e Sobral Advogados, porém, não há mais motivo para processos ficarem suspensos. “Enquanto o STF não decide [os embargos], os casos vão terminando”, afirma. “A modulação é urgente para a PGFN. Para os contribuintes, não.”
O advogado considera prudente aguardar o trânsito em julgado de processo para o aproveitamento de crédito. Mas pondera que, por meio de embargos de declaração, o mérito não será analisado novamente pelos ministros do Supremo.
Diversas empresas, segundo o advogado Bruno Teixeira, do escritório Tozzini Freire Advogados, ainda não apresentaram os reflexos da tese em seus balanços. Companhias mais conservadoras, acrescenta, podem preferir esperar pelo trânsito em julgado no STF. “Reconhecer como ativo traz uma série de consequências, além de dar um upgrade no balanço”, afirma Teixeira. Ele lembra, porém, que se os valores ingressarem como receita, serão tributados.
O tema é relevante para o governo. A arrecadação deste ano poderá perder R$ 45,8 bilhões em decorrência de decisão do STF, segundo a Receita Federal. O órgão estima que mais R$ 6,54 bilhões com o ISS. Contribuintes buscam na Justiça aplicar a tese do ICMS ao tributo municipal.
Procuradas pelo Valor, Telefônica, Ambev, Hering, Pão de Açúcar e Via Varejo preferiram não comentar a questão.
Fonte: Valor Econômico