Imagine, por exemplo, que um consumidor argentino compre pela internet óculos de sol produzidos por uma empresa instalada no Brasil. O resultado dessa compra irá compor o lucro dessa empresa, que acabará sendo tributado pelo governo brasileiro por meio do Imposto de Renda Pessoa Jurídica (IRPJ) .

Pois bem, o que os europeus discutem é a possibilidade de parte do lucro resultante da venda dos óculos ao comprador da Argentina ser tributada também pelo governo argentino.

As discussões sobre esse assunto estão avançadas, segundo o professor de direito tributário João Félix Pinto Nogueira, que atua no International Bureau for Fiscal Documentation (IBFD).

Em um primeiro momento, segundo ele, a ideia é tributar em 3% a receita bruta da empresa, até que se chegue a um consenso sobre como definitivamente fazer o recolhimento.

“A proposta será apresentada em abril para o G-20 (grupo formado pelas 19 maiores economias do mundo mais a União Europeia), sendo que o relatório final tem previsão de ser aprovado em 2020”, disse Nogueira, durante encontro do Conselho de Altos Estudos de Finanças e Tributação (Caeft), da Associação Comercial de São Paulo (ACSP).

A conclusão desse debate pode derrubar um dos conceitos tributários mais dogmáticos, a questão da territorialidade para a cobrança de impostos.

Segundo Nogueira, para as autoridades fazendárias da União Europeia, esse debate está superado. A mudança de paradigma foi estimulada pelo crescimento da economia digital, que tem gerado conflitos entre onde os lucros são tributados –baseado na presença física da empresa – e onde o valor realmente é criado.

“Os técnicos europeus consideram que quando uma empresa realiza atividades significativas numa jurisdição, a sua ausência física não deverá evitar que ela esteja sujeita a imposto sobre o lucro gerado nessa jurisdição”, disse o professor do IBFD.

O QUE SERIA TRIBUTADO?

Haveria um problema de bitributação caso o lucro fosse tributado na origem e no destino. Então, qual seria o mecanismo usado pelo país onde o valor foi criado – ainda que não exista presença física da empresa – para cobrar o imposto?

Segundo Nogueira, a tributação de 3% recairia sobre a receita bruta gerada pela provisão de serviços eletrônicos que estimularam a compra no ambiente digital, como em portais de vendas ou redes sociais. Também sobre os espaços publicitários que permitiram a comunicação com os consumidores.

Pela proposta em análise pela União Europeia, só seriam tributados os “estabelecimentos digitais” – com foram definidas as empresas com presença econômica significativa, ainda que sem presença física – que auferirem receita pelo fornecimento dos serviços acima de determinado patamar.

Os critérios apresentados são: receita acima de R$ 40 milhões no ano (ou 1 mil contratos de fornecimento de serviços digitais firmados) e pelo menos 100 mil consumidores no país que recolherá o imposto.

Polêmico, o tema é tratado em âmbito dos governos europeus como uma maneira de acabar com a desigualdade de tributação entre as empresas tradicionais e aquelas que operam na economia digital.

Na Europa, a tributação sobre o lucro chega a 23,2% para as empresas da economia tradicional, enquanto que para uma empresa que opera no e-commerce, ela varia de 8,9% a 10,1, segundo dados do Ecofin, uma espécie de Confaz Europeu.

Fonte: Portal Tributário