Fundação afirma que sistema educacional contribui para aumento do trabalho infantil

A pedagoga Inês Kisil Misdalo, que coordena a área de Educação Formal do Instituto Ayrton Sena, afirmou que o sistema educacional brasileiro contribui para o crescimento do trabalho infantil.  “À medida que a qualidade da educação deixa a desejar, colocamos na sociedade a possibilidade da exploração infantil”, alertou durante apresentação no painel “Experiências de inclusão social de crianças e adolescentes pela educação”.

Ela destacou que, embora 98% das crianças estejam na escola, cerca de 3,5 milhões são reprovadas anualmente. O problema não seria de oferta, mas da qualidade que não mantém as crianças na escola. Mostrou-se preocupada com a evasão no ensino médio, que chega a 40%, em uma faixa etária onde ocorre o começo da vida profissional para muitos desses adolescentes.

Kisil relatou experiências do Instituto Ayrton Senna no treinamento dos adultos que têm contato direito com as crianças. Ela criticou a falta de planejamento na educação do país e a qualidade das nossas escolas públicas, ainda voltadas para o século XX e XIX, pouco atraentes para os jovens de hoje.

Erradicação do trabalho infantil pela educação

A cientista social Patrícia Mara Santin, gerente da área da infância e da adolescência da Fundação Telefônica, ligada à Vivo, disse hoje no Seminário que a sociedade não tem o entendimento de que o trabalho infantil “é um problema da nossa conta”, que precisa e pode ser resolvido pela educação ampla, com o auxílio de parcerias.

A própria falta de consenso sobre o que é trabalho infantil tem levado as pessoas que trabalham na área a identificar equivocadamente quais crianças realmente necessitam de atendimento, manifestou a palestrante. Preocupada com essa questão, ela informou que a sua organização utiliza um modelo de diagnóstico rápido desenvolvido pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), que possibilita, inclusive, a identificação de trabalho infantil doméstico, que é invisível na sociedade.

Para Patrícia Santin, os alarmantes números oficiais que dimensionam o trabalho infantil no Brasil são apenas a ponta do iceberg, porque a  experiência tem demonstrado que os problemas são muito maiores. Na sua opinião, os municípios não veem conseguindo articular adequadamente o papel dos conselhos de direitos, como o tutelar, compreendidos no Sistema Único de Assistência Social, coordenado pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. “A fundação trabalha no sentido de que esse sistema funcione na prática”, disse Patrícia Santin.

Fundação Gol de Letra propõe educação articulada e integral

O representante da Fundação Gol de Letra, Felipe Pitaro, defendeu, em sua participação no painel, o desenvolvimento de ações articuladas voltadas para a formação integral de crianças e jovens. “O fracasso do sistema educacional reside, em parte, na expectativa de que o Estado e a iniciativa privada façam toda a ação de transformação”, afirmou.

A fundação, criada em 1998 pelos jogadores de futebol Raí e Leonardo, desenvolve diversos programas voltados para a transformação social por meio da educação, com ênfase no desenvolvimento de valores como dignidade, solidariedade, perseverança e fraternidade, e, através de parcerias com empresas, promove a inserção de jovens no mercado de trabalho. Hoje, os programas atendem cerca de 1.600 crianças diretamente, além de suas famílias.

Pitaro, que é professor da rede estadual do Rio de Janeiro, afirma que a articulação com o Estado, ainda frágil, precisa ser fortalecida para que a educação mude de um processo de disciplina e rendimento para um de construção de cultura e ação social legítima. “Educação é um ato voluntário, e a estrutura física e a grade curricular não garantem a educação”, defende. O processo, conclui, precisa fazer sentido para o educando, gerar modelos e criar um cenário de envolvimento.

(Augusto Fontenele, Mário Correia e Carmem Feijó / RA )

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