O governo federal considera possível a derrota em processos judiciais que discutem quase R$ 1 trilhão. As ações e recursos tramitam no Supremo Tribunal Federal e no Superior Tribunal de Justiça, segundo relatório da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional anexado à proposta de Lei de Diretrizes Orçamentária de 2019.
A peça levanta todos os processos judiciais com impacto fiscal relevante em que a PGFN considera a derrota “possível” — ainda que em alguns casos seja improvável, por já haver maioria de votos a favor do Fisco, mas o processo estar parado por pedido de vista. De acordo com o relatório, os processos em trâmite no STF têm impacto calculado em R$ 997,12 bilhões. No STJ, de R$ 97,96 bilhões.
As contas consideram sempre o pior cenário possível: são feitas com base em dados da Receita Federal e levam em consideração, na maioria dos casos, a perda total de arrecadação anual e estimam ter de devolver o máximo possível a todos os contribuintes que supostamente teriam direito ao crédito, o que costuma não se concretizar.
Riscos Fiscais
Em abril, o STJ publicou o acórdão do Recurso Especial 1.221.170. Nesse caso, definiu que, para fins de crédito de PIS e Cofins, as empresas podem considerar insumo tudo o que for essencial para o “exercício estatutário da atividade econômica”.
Com isso, o tribunal mudou o entendimento que vinha prevalecendo na 1ª Turma, de que insumo seria tudo o que tivesse relação de “essencialidade ou pertinência” com a atividade da empresa, para ser tudo o que tenha relação de “essencialidade ou relevância” com o serviço prestado pela empresa. Venceu o entendimento da ministra Regina Helena Costa.
A consequência da decisão foi a declaração de ilegalidade de duas instruções normativas da Receita que, segundo o STJ, restringiam o conceito de insumo para reduzir o aproveitamento de créditos de PIS e Cofins. O Fisco, disse a ministra Regina, usava a técnica do IPI, um imposto, para calcular os créditos de PIS e Cofins, contribuições sociais que incidem sobre o faturamento das empresas.
Risco irreal
O impacto, segundo o governo, será de R$ 50 bilhões, já que a decisão foi tomada em recurso repetitivo e tem aplicação imediata a todos os processos em trâmite nos tribunais regionais federais.
Também em abril, ao analisar 25 processos, a 1ª Turma do STF reafirmou o entendimento firmado pela corte de que o ICMS, por não compor faturamento ou receita bruta das empresas, deveria ser excluído da base de cálculo do PIS e da Cofins. Por unanimidade, o colegiado manteve integralmente a decisão monocrática do relator, ministro Marco Aurélio segundo o qual “o ICMS não compõe a base de cálculo do PIS e da Cofins”. O julgamento desse caso ocorreu em março de 2017.
De acordo com a Receita, o impacto dessa decisão será de R$ 250,3 bilhões nos cofres da União. É o equivalente ao que terá de devolver e a reduções na arrecadação de R$ 27 bilhões por ano, que seria o quanto o governo leva pela inclusão do ICMS na base do PIS e da Cofins.
Mas são números “chutados”, segundo artigo escrito pelos tributaristas Breno Vasconcelos, Tathiane Piscitelli e Maria Raphaela Matthiesen. Para fazer o texto, eles fizeram uma série de perguntas à Receita Federal para saber como se havia chegar à cifra de R$ 250 bilhões. A resposta foi que não se pode dar muita certeza: “Pelo surpreendente motivo de não existirem tais informações, foi negado o pedido de acesso aos dados numéricos e suas respectivas fontes, e os critérios ou fórmulas adotados para o cálculo da estimativa de 9,57%”, diz o artigo. O texto foi publicado na Revista de Direito Tributário Contemporâneo.
Para os advogados, a nota interna da Receita assume que os valores constantes do Anexo de Riscos Fiscais não são passíveis de refletirem o real prejuízo da União. “Isso tudo coloca sob suspeição a integridade dos argumentos submetidos pela União aos Ministros do STF. Como agora se constata, a Fazenda, ao formular verbalmente pedido de modulação em virtude do conceito vago e indeterminado de “interesse social”, tomou por verdadeiro dado não demonstrado e construído sobre critérios e metodologia desconhecidos pela própria Administração”, afirma a tese.
Atuação da PGFN
No âmbito do STJ, a PGFN atua nas ações judiciais de natureza tributária em que a União é parte, bem como nas ações de seu interesse. Já no âmbito do STF, a PGFN atua nos recursos extraordinários e agravos que tratam de matéria tributária e acompanha as ações originárias representadas judicialmente pelo Advogado Geral da União.
Ana Pompeu é repórter da revista Consultor Jurídico.
Gabriela Coelho é repórter da revista Consultor Jurídico
Fonte: Consultor Jurídico