DOU de 29.12.2017
Dispõe sobre os conceitos de trabalho em condições análogas à de escravo para fins de concessão de seguro-desemprego ao trabalhador que vier a ser resgatado em fiscalização do Ministério do Trabalho, nos termos do artigo 2°-C da Lei n° 7.998, de 11 de janeiro de 1990, e trata da divulgação do Cadastro de Empregadores que tenham submetido trabalhadores à condição análoga à de escravo, estabelecido pela Portaria Interministerial MTPS/MMIRDH n° 4, de 11 de maio de 2016.
O MINISTRO DE ESTADO DO TRABALHO, no uso da atribuição que lhe confere o art. 87, parágrafo único, inciso II, da Constituição Federal, e
CONSIDERANDO a Convenção n° 29 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), promulgada pelo Decreto n° 41.721, de 25 de junho de 1957;
CONSIDERANDO a Convenção n° 105 da OIT, promulgada pelo Decreto n° 58.822, de 14 de julho de 1966;
CONSIDERANDO a Convenção sobre a Escravatura de Genebra, promulgada pelo Decreto n° 58.563, de 1° de junho de 1966;
CONSIDERANDO a Convenção Americana sobre Direitos Humanos, promulgada pelo Decreto n° 678, de 6 de novembro de 1992;
CONSIDERANDO a Lei n° 7.998, de 11 de janeiro de 1990, bem como a Lei n° 10.608, de 20 de dezembro de 2002; e
CONSIDERANDO o disposto no art. 149 do Decreto-Lei n° 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal).
RESOLVE:
Art. 1° Para fins de concessão de benefício de seguro-desemprego ao trabalhador que for encontrado em condição análoga à de escravo no curso de fiscalização do Ministério do Trabalho, nos termos da Portaria MTE n° 1.153, de 13 de outubro de 2003, bem como para inclusão de administrados no Cadastro de Empregadores que tenham submetido trabalhadores à condição análoga à de escravo, estabelecido pela Portaria Interministerial MTPS/MMIRDH n° 4, de 11 de maio de 2016, considera-se em condição análoga à de escravo o trabalhador submetido, de forma isolada ou conjuntamente, a:
I – Trabalho forçado;
II – Jornada exaustiva;
III – Condição degradante de trabalho;
IV – Restrição, por qualquer meio, de locomoção em razão de dívida contraída com empregador ou preposto, no momento da contratação ou no curso do contrato de trabalho;
V – Retenção no local de trabalho em razão de:
a) Cerceamento do uso de qualquer meio de transporte;
b) Manutenção de vigilância ostensiva;
c) Apoderamento de documentos ou objetos pessoais.
Art. 2° Para os fins previstos na presente Portaria:
I – Trabalho forçado é aquele exigido sob ameaça de sanção física ou psicológica e para o qual o trabalhador não tenha se oferecido ou no qual não deseje permanecer espontaneamente.
II – Jornada exaustiva é toda forma de trabalho, de natureza física ou mental, que, por sua extensão ou por sua intensidade, acarrete violação de direito fundamental do trabalhador, notadamente os relacionados a segurança, saúde, descanso e convívio familiar e social.
III – Condição degradante de trabalho é qualquer forma de negação da dignidade humana pela violação de direito fundamental do trabalhador, notadamente os dispostos nas normas de proteção do trabalho e de segurança, higiene e saúde no trabalho.
IV – Restrição, por qualquer meio, da locomoção do trabalhador em razão de dívida é a limitação ao direito fundamental de ir e vir ou de encerrar a prestação do trabalho, em razão de débito imputado pelo empregador ou preposto ou da indução ao endividamento com terceiros.
V – Cerceamento do uso de qualquer meio de transporte é toda forma de limitação ao uso de meio de transporte existente, particular ou público, possível de ser utilizado pelo trabalhador para deixar local de trabalho ou de alojamento.
VI – Vigilância ostensiva no local de trabalho é qualquer forma de controle ou fiscalização, direta ou indireta, por parte do empregador ou preposto, sobre a pessoa do trabalhador que o impeça de deixar local de trabalho ou alojamento.
VII – Apoderamento de documentos ou objetos pessoais é qualquer forma de posse ilícita do empregador ou preposto sobre documentos ou objetos pessoais do trabalhador.
Art. 3° Os conceitos estabelecidos no artigo 2° desta norma deverão ser observados pelo Auditor-Fiscal do Trabalho em qualquer ação fiscal direcionada para erradicação do trabalho em condição análoga à de escravo ou em ações fiscais em que for identificada condição análoga à de escravo, independentemente da atividade laboral, seja o trabalhador nacional ou estrangeiro, inclusive quando envolver a exploração de trabalho doméstico ou de trabalho sexual, bem como para fins de inclusão de registro no Cadastro de Empregadores que tenham submetido trabalhadores à condição análoga à de escravo estabelecido pela Portaria Interministerial MTPS/MMIRDH n° 4/2016.
Art. 4° Aplica-se o disposto nesta Portaria aos casos em que o Auditor-Fiscal do Trabalho identifique tráfico de pessoas para fins de exploração de trabalho em condição análoga à de escravo, desde que presente qualquer das hipóteses previstas nos incisos I a V do artigo 1° desta Portaria.
Parágrafo único. Considera-se tráfico de pessoas para fins de exploração de trabalho em condição análoga à de escravo o recrutamento, o transporte, a transferência, o alojamento ou o acolhimento de pessoas, recorrendo à ameaça ou uso da força ou a outras formas de coação, ao rapto, à fraude, ao engano, ao abuso de autoridade ou à situação de vulnerabilidade ou à entrega ou aceitação de pagamentos ou benefícios para obter o consentimento de uma pessoa que tenha autoridade sobre outra.
Art. 5° O trabalho realizado em condição análoga à de escravo, sob todas as formas, constitui atentado aos direitos humanos fundamentais e à dignidade do trabalhador, sendo dever do Auditor-Fiscal do Trabalho combater a sua prática.
Art. 6° A Administração Central do Ministério do Trabalho e as Superintendências Regionais do Trabalho deverão prover a Inspeção do Trabalho de todos os recursos necessários para a fiscalização e combate ao trabalho em condições análogas às de escravo, cujo combate será prioritário em seus planejamentos e ações.
Art. 7° As ações fiscais para erradicação do trabalho em condição análoga à de escravo serão planejadas e coordenadas pela Secretaria de Inspeção do Trabalho, que as realizará diretamente, por intermédio das equipes do Grupo Especial de Fiscalização Móvel, e pelas Superintendências Regionais do Trabalho (SRT), por meio de grupos ou equipes de fiscalização.
Parágrafo único. As ações fiscais previstas no caput deverão contar com a participação de representantes da Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal, Polícia Militar Ambiental, Polícia Militar, Polícia Civil, ou outra autoridade policial que garanta a segurança da fiscalização.
Art. 8° A identificação de trabalho em condição análoga à de escravo em qualquer ação fiscal ensejará a adoção dos procedimentos previstos no artigo 2°-C, §§ 1° e 2°, da Lei n° 7.998, de 11 de janeiro de 1990, devendo o Auditor-Fiscal do Trabalho resgatar o trabalhador que estiver submetido a essa condição e emitir o Requerimento do Seguro-Desemprego do Trabalhador Resgatado.
Art. 9° Constatada situação de grave e iminente risco à segurança e à saúde do trabalhador, deverá ser realizado, de forma imediata, o embargo ou a interdição e adotadas as demais medidas previstas em lei.
Art. 10. Com vistas a proporcionar o acolhimento de trabalhador submetido a condição análoga à de escravo, seu acompanhamento psicossocial e o acesso a políticas públicas, o Auditor-Fiscal do Trabalho deverá, no curso da ação fiscal:
I – Orientar os trabalhadores a realizar sua inscrição no Cadastro Único da Assistência Social, sempre que possível encaminhando-os para o órgão local responsável pelo cadastramento;
II – Comunicar por escrito a constatação de trabalhadores submetidos a condição análoga à de escravo ao Centro de Referência Especializado de Assistência Social – CREAS mais próximo ou, em caso de inexistência, ao Centro de Referência de Assistência Social – CRAS, solicitando o atendimento às vítimas;
III – Comunicar aos demais órgãos ou entidades da sociedade civil eventualmente existentes na região voltados para o atendimento de vítimas de trabalho análogo ao de escravo.
§ 1° Os procedimentos previstos nos incisos II e III não serão adotados quando implicarem risco ao trabalhador.
§ 2° Caso se verifique que os procedimentos previstos nos incisos II e III implicam risco de prejuízo ao sigilo da fiscalização, o Auditor-Fiscal do Trabalho poderá adotá-los ao final da ação.
Art. 11. Os casos de trabalhadores estrangeiros em situação de vulnerabilidade, vítimas de tráfico de pessoas e/ou de trabalho análogo ao de escravo deverão ser encaminhados para concessão de sua residência permanente no território nacional, de acordo com o que determinam art. 30 da Lei n° 13.445, de 24 de maio de 2017, e a Resolução Normativa n° 122, de 3 de agosto de 2016, do Conselho Nacional de Imigração – CNIg.
Parágrafo único. O encaminhamento será efetuado por meio de memorando da Chefia de Fiscalização à Divisão de Fiscalização para Erradicação do Trabalho Escravo (DETRAE) da Secretaria de Inspeção do Trabalho, devidamente instruído com pedido de autorização imediata de residência permanente formulado pelo Auditor-Fiscal do Trabalho responsável pelo resgate. A DETRAE, por sua vez, oficiará o Ministério da Justiça e Cidadania requerendo deferimento do pedido de autorização.
Art. 12. Quando o Auditor-Fiscal do Trabalho identificar a ocorrência de uma ou mais hipóteses previstas nos incisos I a V do art. 1°, deverá lavrar auto de infração conclusivo a respeito da constatação de trabalho em condição análoga à de escravo, descrevendo de forma circunstanciada e pormenorizada os fatos que fundamentaram a caracterização.
Parágrafo único. A Secretaria de Inspeção do Trabalho adotará as providências necessárias para a identificação dos autos de infração lavrados de forma conjunta.
Art. 13. Da lavratura do auto de infração pelo Auditor-Fiscal do Trabalho com base na Portaria Interministerial MTPS/MMIRDH n° 4/2016 assegurar-se-á ao administrado o exercício do contraditório e da ampla defesa, na forma do que determinam o art. 5°, LIV e LV, da Constituição Federal; a Lei n° 9.784, de 29 de janeiro de 1999; e a Portaria MTPS n° 854, de 25 de junho de 2015.
Art. 14. O Cadastro de Empregadores previsto na Portaria Interministerial MTPS/MMIRDH n° 4/2016 será divulgado no sítio institucional do Ministério do Trabalho na rede mundial de computadores, contendo a relação dos administrados autuados em ação fiscal em que tenham sido identificados trabalhadores submetidos a condições análogas à de escravo.
§ 1° A inclusão do empregador somente ocorrerá após a prolação de decisão administrativa irrecorrível de procedência do auto de infração lavrado na ação fiscal em razão da constatação de submissão de trabalhadores em condições análogas à de escravo.
§ 2° A organização e divulgação do Cadastro ficará a cargo da DETRAE, cuja divulgação será realizada na forma do caput.
§ 3° A Assessoria de Comunicação e demais órgãos do Ministério do Trabalho deverão garantir todos os meios necessários para que a Secretaria de Inspeção do Trabalho possa realizar a divulgação do Cadastro prevista no caput e no art. 2° da Portaria Interministerial MTPS/MMIRDH n° 4/2016.
Art. 15. O Auditor-Fiscal do Trabalho deverá obrigatoriamente providenciar a elaboração de relatório de fiscalização, nas situações em que for identificada a prática de quaisquer dos tipos infracionais previstos no art. 1° desta Portaria.
Parágrafo único. A ausência de quaisquer dos documentos elencados neste artigo implicará na devolução do processo por parte da Secretaria de Inspeção do Trabalho, para que o Auditor-Fiscal o instrua corretamente.
Art. 16. O Relatório de Fiscalização em que houver a caracterização do trabalho em condições análogas às de escravo será disponibilizado ao autuado, ou a qualquer interessado, após solicitação realizada à chefia de fiscalização da Superintendência Regional do Trabalho responsável pela circunscrição em que foi constatado o ilícito.
Parágrafo único. A Secretaria de Inspeção do Trabalho encaminhará os Relatórios de Fiscalização em que houver a caracterização do trabalho em condições análogas às de escravo ao Ministério Público Federal para as providências cabíveis no âmbito de sua competência.
Art. 17. A Secretaria de Inspeção do Trabalho disciplinará os procedimentos de fiscalização de que trata esta Portaria, por intermédio de instrução normativa a ser editada em até 60 (sessenta dias) dias.
Art. 18. Esta Portaria entra em vigor na data de sua publicação.
RONALDO NOGUEIRA DE OLIVEIRA