Na semana passada, a Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados aprovou a admissibilidade da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) n.º 45, de 2019, com o voto favorável de quase todos os partidos. Nesta etapa apenas a constitucionalidade da proposta foi avaliada, mas foi o passo inicial de um processo que, se concluído, representará a maior mudança do sistema tributário brasileiro dos últimos 50 anos.

A PEC 45 unifica cinco tributos atuais – dos quais três federais (IPI, PIS e Cofins) , um estadual (ICMS) e um municipal (ISS) – em um único Imposto sobre Bens e Serviços (IBS). Com a mudança, que será implementada ao longo de dez anos, corrigem-se todos os problemas do atual modelo brasileiro de tributação do consumo, o que resultará em maior investimento, menor custo burocrático de pagamento de impostos, menor litígio entre os contribuintes e o governo e uma organização mais eficiente da economia.

Como a PEC 45 afeta não apenas tributos federais, mas também estaduais e municipais, é natural que surjam dúvidas sobre qual será seu efeito sobre os entes da federação. Esse é o tema desenvolvido neste artigo.

De início, é importante deixar claro que a PEC 45 mantém a autonomia financeira dos Estados e municípios, pois estes poderão definir a parcela da alíquota do IBS que lhes compete e, portanto, sua arrecadação. Pela proposta, a alíquota do IBS será uniforme para todos os bens e serviços, mas será formada pela soma de uma alíquota federal, uma estadual e uma municipal. Na ausência de lei do ente federado fixando a alíquota em nível distinto, é adotada automaticamente uma alíquota de referência que preserva a carga tributária atual.

Outra questão relevante diz respeito ao impacto da PEC 45 sobre as receitas dos entes federados. Pela proposta, a receita do IBS será distribuída pelo princípio do destino, ou seja, nas transações interestaduais e intermunicipais a receita pertencerá ao Estado e ao município de destino. Tal mudança implica uma redistribuição da participação dos entes no bolo total da arrecadação. Para mitigar o efeito dessa mudança, a PEC 45 propõe uma transição muito longa – de 50 anos – para que a atual distribuição da receita convirja para a distribuição pelo destino. Com o impacto positivo da reforma tributária sobre o crescimento – e, portanto, sobre as receitas estaduais e municipais –, praticamente nenhum ente da federação será prejudicado.

Um terceiro ponto, talvez o principal, diz respeito à autonomia para a concessão de benefícios fiscais, a qual é percebida como um instrumento de desenvolvimento pelos Estados. Como a PEC 45 proíbe a concessão de benefícios no âmbito do IBS, esse instrumento não estará mais disponível. Em contrapartida, propõe-se a alocação de recursos orçamentários da União para financiar a política de desenvolvimento regional.

O efeito dessa mudança é a substituição de uma política de desenvolvimento que tem se mostrado extremamente ineficiente – porque a concessão de benefícios não explora as vocações regionais – por uma política eficiente de desenvolvimento regional.

Adicionalmente, a mudança interromperá o processo perverso de corrosão das bases tributárias dos Estados que resulta da guerra fiscal, inclusive porque hoje até os Estados mais ricos estão concedendo benefícios.

Por fim, uma característica da PEC 45 que reforça o federalismo é a gestão compartilhada do IBS. Pela proposta, a cobrança, regulamentação e fiscalização do novo imposto será de responsabilidade de um Comitê Gestor – gerido conjuntamente pela União, pelos Estados e pelos municípios.

No agregado, o objetivo da PEC 45 é substituir um modelo federativo ineficiente e fratricida por um sistema eficiente e cooperativo. Com a mudança, os Estados e municípios serão beneficiados pelo maior crescimento, sem perder a autonomia na gestão de suas finanças e de uma política de desenvolvimento mais efetiva que a atual.

Fonte: O Estado de S.Paulo