Rio Grande do Sul deixa de arrecadar 20% dos impostos potenciais
Os R$ 8,9 bilhões em desonerações fiscais oferecidos pelo Estado se transformaram em motivo de controvérsia nas últimas semanas. Uma parcela de políticos, servidores e economistas defende a revisão desses benefícios para cobrir o crônico déficit orçamentário gaúcho, mas o governo argumenta que o plano de redirecionar esse recurso para sanear as finanças públicas esbarra em problemas legais e estratégicos.
Uma análise mais detalhada dos dados da Receita Estadual mostra que a cifra mais suscetível a cortes são R$ 2,5 bilhões oferecidos no ano passado como créditos presumidos — instrumento utilizado para atrair investimentos e estimular setores econômicos. Nesse caso, o desafio é escolher a quem retirar o apoio.
Nos últimos dias, a desoneração fiscal se tornou alvo de controvérsia em meio ao debate sobre a penúria do Tesouro. O relator da proposta de orçamento para o ano que vem, deputado Marlon Santos (PDT), argumentou que as contas públicas, na verdade, não teriam déficit.
— O total deixado de arrecadar é de R$ 9 bilhões, representando 23% do ICMS potencial — sustentou o relator, que defende uma revisão das desonerações para tapar o rombo financeiro.
Setores produtivos veem com preocupação a perda de benefícios, uma vez que essas medidas reduzem custos, aumentam a competitividade e, em consequência, impulsionam a economia e a arrecadação.
— Já é difícil atrair novas indústrias e manter as que temos. Precisamos pensar em como vamos desenvolver o Estado se tirarmos os incentivos — observa o presidente da Federação das Indústrias do RS (Fiergs), Heitor Müller.
O economista da Fundação de Economia e Estatística (FEE) e professor da PUCRS Alfredo Meneghetti Neto concorda com a renúncia de tributos como instrumento de estímulo, mas acredita que houve exagero nas últimas décadas. Um levantamento indica que, nos últimos 35 anos, o PIB gaúcho cresceu 329%. Em contrapartida, o ICMS, principal imposto estadual, aumentou 291% — diferença de 38 pontos percentuais.
— Essa defasagem entre o PIB e o ICMS, estimulada pelas desonerações fiscais, era uma bomba-relógio — analisa o economista.
Por trás da polêmica há um montante de R$ 16,5 bilhões em renúncias fiscais registradas no ano passado, dos quais R$ 7,59 bilhões são determinados por normas constitucionais (envolvendo principalmente itens de exportação) e não podem ser alterados pelo Estado (veja mais no quadro ao final do texto).
Os R$ 8,9 bilhões restantes seriam mais do que suficientes para reverter o déficit estimado em R$ 2,9 bilhões para o próximo ano. Nem todas as renúncias de tributo, porém, seriam facilmente revertidas para os cofres públicos. Cerca de R$ 816 milhões são desonerações chamadas “operacionais”, destinadas a racionalizar o sistema ao evitar cobranças intermediárias ou inócuas, como entrada e saída de produtos para beneficiamento.
Do total de R$ 1,5 bilhão em redução de impostos para micro e pequenas empresas, cerca de R$ 1,1 bilhão são garantidos pela legislação nacional do Simples, e apenas R$ 400 milhões por iniciativa local e poderiam ser cancelados. Outros R$ 125 milhões beneficiam o próprio setor público ao isentar bens destinados à administração.
Restariam perto de R$ 7 bilhões. Pouco mais da metade disso corresponde a isenções e reduções de base de cálculo para determinados setores, mas há convênios de caráter obrigatório firmados pelo Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) com os Estados. Outra fração tem impacto ao aliviar o custo de remédios e alimentos, por exemplo.
As desonerações com maior flexibilidade são os R$ 2,5 bilhões restantes que compõem os chamados créditos presumidos — abatimento do ICMS a fim de atrair investimentos.
— Podemos cortar o benefício oferecido ao setor leiteiro, mas o preço do leite vai subir — exemplifica o subsecretário da Receita Estadual, Mario Luís Wunderlich dos Santos.
Nenhum dos recentes governos gaúchos fez cortes profundos nos benefícios fiscais. Nos últimos 10 anos, a desoneração variou entre 17% e 24% dos impostos potenciais. No pacote de reforma do Estado enviado à Assembleia, está previsto um corte de R$ 300 milhões nos créditos presumidos.
Fonte: Portal ZH Notícias.